Longe dos livros de história escolares e da mídia local, pouco se fala sobre o papel da população afrodescendente na colonização de Joinville e de suas tradições, cultura e memórias. Mas a verdade é que estudos de historiadores da cidade comprovam o uso do trabalho escravo em terras onde hoje é Joinville, bem como na construção da Estrada Dona Francisca. A comunidade Caminho Curto, localizada no Distrito de Pirabeiraba, faz parte do grupo que se identifica como descendente desses escravos da região e remanescente quilombola, e ainda hoje aguarda a regulamentação das terras, tendo dificuldade de acesso à saúde pública, saneamento básico ou à educação do Ensino Fundamental 2 e Médio.
Com o intuito de discutir a atual conjuntura da comunidade, o Projeto Integrado Caminho Curto da Univille participou do encontro com o defensor regional de direito humanos, Célio Alexandre John, na última quinta-feira, 21 de fevereiro. A proposta da reunião, que aconteceu em conjunto com a Gerência Regional de Educação de Joinville (Gered) e a coordenação do curso de Direito da Universidade, foi debater ações que contribuam para a melhoria das condições socioeconômicas das famílias que residem ali, como a certificação de comunidade remanescente quilombola da Fundação Palmares, o que garantiria, de acordo com o site da fundação, a demarcação e o direito dessas terras.
A professora Alessandra Bernardino, da Gered de Joinville, ressalta que foram feitas pesquisas por antropólogos e historiadores que reconheceram a comunidade como remanescente quilombola. "Toda documentação foi encaminhada, mas sem a devida certificação pela Fundação Palmares", contestou. A professora também levantou as questões de desistência dos estudos. "Um dos principais relatos para a evasão escolar foi a questão do transporte público. Até o quinto ano escolar, os alunos têm a escola ao lado da comunidade. Já nos anos seguintes, precisam frequentar a escola mais próxima, no Centro de Pirabeiraba", conclui.
Para o defensor regional de direitos humanos, Célio Alexandre John, a Defensoria Pública da União poderá ajudar a comunidade com o atendimento jurídico e acelerar o processo de documentação das terras. “Em caso de demora irrazoável na resolução administrativa, poderemos ingressar com ação judicial para o término do procedimento", explica.
Segundo a professora e pró-reitora de Ensino da Univille, Sirlei de Souza, que integra o Projeto Caminho Curto, as pesquisas históricas feitas por Dilney Cunha e pela professora de Mestrado em Patrimônio Cultural e Sociedade, Sandra Guedes, o uso do trabalho de negros escravos na época é inegável. “Havia também a existência de engenhos localizados próximo ao local daquela comunidade. Fatos que indicam a presença histórica de afrodescendentes nas comunidades quilombolas na região ”, completa a docente.
O Projeto Caminho Curto da Univille acontece desde 2018 promovendo atividades e oficinas na comunidade envolvendo assuntos como direitos humanos, debates pertinentes às populações afrodescendentes, bem como direitos ligados à terra, saúde e educação. As ações são desenvolvidas interdisciplinarmente entre os cursos de História, Direito, Publicidade e Propaganda, Enfermagem e Odontologia. “Houve uma solicitação das mulheres para que desenvolvêssemos atividades ligadas à saúde, devido às dificuldades para o acesso aos serviços do setor”, explica a professora. “Assim fizemos parceria com ambulatório da Univille para consultas, parceria com uma psicóloga voluntária para atendimento de escuta às mulheres e oficinas com as crianças para promoção da saúde e prevenção de doenças”, completou.
Para os próximos meses ficou definida a intenção de visitar a comunidade quilombola com todos os envolvidos, Defensoria Pública da União, Univille e Gerência Regional de Educação de Joinville (Gered).